Inteligência Artificial e Geopolítica: Como a regulação da IA está redesenhando o comércio internacional
Em um cenário de constante evolução tecnológica no século XXI, a proposta da Inteligência Artificial foi enxergada como um advento revolucionário que não só otimizaria alguns processos de produção, como também seria capaz de substituir a inteligência humana em determinadas tarefas. Com a sua implementação e popularização dos últimos anos, as IA’s rompem por completo seus limites de apenas uma ferramenta técnica, e se demonstra como um fenômeno capaz de influenciar relações políticas, sociais, e até mesmo comerciais em escala global. Esse panorama é evidenciado pela World Trade Organization (WTO) – Organização Mundial do Comércio (OMC) – em seu relatório “Intelligence: How AI shapes and is shaped by international trade”, publicado em 2024, no qual a organização enfatiza que a AI está no epicentro de uma reconfiguração profunda das estruturas do comércio global. Haja vista que essa ferramenta é capaz de promover eficiência e produtividade em detrimento de desafios regulatórios e da perpetuação da desigualdade entre países e empresas.
Como a Inteligência Artificial Afeta o Comércio Internacional?
A Inteligência Artificial vem se consolidando como uma tecnologia de propósito geral capaz de reconfigurar as dinâmicas do comércio internacional. Sua adaptabilidade a setores produtivos e aprendizado contínuo a partir de grandes volumes de dados permitem otimizar processos logísticos, automatizar procedimentos regulatórios e fortalecer a previsibilidade nas cadeias globais de suprimento. Ao reduzir custos operacionais e barreiras técnicas, a IA abre novas oportunidades para economias em desenvolvimento, ao mesmo tempo em que transforma as vantagens comparativas, mediadas por conectividade digital, capital intelectual e infraestrutura energética. Ademais, a demanda por ativos complementares — como chips, softwares especializados e telecomunicações — reforça a centralidade da IA, redistribuindo poder tecnológico e econômico globalmente.
AI can be leveraged to overcome trade costs associated with trade logistics, supply chain management and regulatory compliance […]. All of this could lower trade costs and, as a result, level the playing field for developing economies and small businesses, helping them to overcome trade barriers, enter global markets and participate in international trade.
(WTO, Trading with Intelligence: How AI shapes and is shaped by international trade, 2024, p. 5)
Regulação da IA e a Nova Configuração do Comércio Internacional.
Em um cenário marcado pela disputa por hegemonia tecnológica entre Estados Unidos, União Europeia e China, a regulação da IA tornou-se expressão concreta do poder normativo. O AI Act, aprovado pela União Europeia em 2024, exemplifica como padrões regulatórios assumem papel geopolítico ao exportar normas e influenciar governança além das fronteiras do bloco — fenômeno conhecido como Brussels Effect.
Esse movimento impõe custos de conformidade para empresas globais e favorece atores integrados à lógica regulatória europeia, enquanto marginaliza empresas de países com regimes frágeis ou descoordenados. No caso da China, o país adota controle estatal e usa a IA como vetor de segurança nacional e eficiência industrial. Já os EUA resistem a uma regulação ampla federal, mantendo vantagem pela inovação e sanções extraterritoriais. Assim, a disputa por padrões regulatórios traduz-se numa luta por soft power tecnológico, onde definir o aceitável no uso da IA estrutura os fluxos comerciais.
Comércio Internacional, Barreiras e Fragmentação Normativa
O relatório da OMC chama atenção para um risco central: a fragmentação normativa. À medida que países e blocos adotam regulações divergentes sobre ética algorítmica, governança de dados, uso de IA generativa e proteção de propriedade intelectual, surgem novas barreiras não tarifárias. Essas barreiras afetam, por exemplo, a interoperabilidade de sistemas, a transferência de modelos de IA e o fluxo transfronteiriço de dados — insumo essencial para treinar algoritmos e alimentar sistemas de machine learning.
A OMC alerta que essas fraturas regulatórias podem gerar “tensões comerciais sistêmicas”, prejudicando particularmente países em desenvolvimento, que se veem forçados a alinhar-se a normas impostas por potências, sob pena de exclusão tecnológica. Pequenas e médias empresas enfrentam desvantagens competitivas ao tentar se adequar a múltiplos padrões técnicos, o que pode restringir sua participação nas cadeias globais de valor.
O Papel da OMC e a Urgência de um Marco Mutilateral
Diante do risco de fragmentação, a OMC propõe uma atuação mais ativa na construção de uma governança comercial multilateral da IA. Isso inclui três frentes prioritárias: a facilitação do comércio relacionado à IA, com a redução de barreiras técnicas; promoção da harmonização regulatória, por meio de fóruns de diálogo técnico e regulatório; mitigação de tensões comerciais, com mecanismos de solução de controvérsias que considerem as especificidades da IA.
Além disso, o relatório propõe investimentos em capacitação técnica, infraestrutura digital e políticas de inclusão para evitar que a IA se torne um vetor de exclusão econômica global. Essas medidas são essenciais para garantir que os ganhos do comércio de bens e serviços intensivos em IA sejam amplamente compartilhados.
O Brasil e a Estratégia de Inserção Inteligente
A presença brasileira no lançamento do relatório, representada pela Associação Brasileira das Empresas de Software (ABES), sinaliza um movimento de inserção estratégica no debate global. O Brasil enfrenta o desafio de equilibrar sua posição entre os grandes blocos reguladores e construir uma agenda própria, que articule soberania digital, inclusão produtiva e inserção qualificada nas cadeias globais de tecnologia.
A regulação nacional de IA ainda está em construção, mas será determinante para definir o grau de integração do país no novo comércio digital. Como alerta Eduardo Paranhos, representante da ABES, o Brasil não pode ser apenas um seguidor de normas externas — deve participar da formulação de padrões que reflitam seus interesses e realidades socioeconômicas.
Importância do Estudo de Mercado em um Comércio Internacional Redesenhado pela IA
Diante desse cenário de transformações rápidas e assimétricas impulsionadas pela Inteligência Artificial, torna-se ainda mais crucial compreender como as novas dinâmicas do comércio internacional afetam diretamente setores, regiões e perfis de empresa específicos. O impacto da IA não é homogêneo — ele depende de fatores como infraestrutura digital, capital humano, regulação local e grau de maturidade tecnológica de cada economia. Por isso, identificar com precisão onde estão as melhores oportunidades exige mais do que intuição: exige inteligência estratégica. É justamente nesse ponto que um Estudo de Mercado aprofundado se torna essencial, permitindo diagnosticar, com base em uma análise personalizada de marcadores culturais, políticos e econômicos, em quais regiões o seu negócio encontrará maior aderência, menor resistência e maior retorno. Em um mundo redesenhado pela tecnologia, decidir onde e como competir é uma decisão que precisa estar ancorada em evidências.
QUEM ESCREVEU:
Tags: analise de cenario, comércio exterior, comércio internacional, consultoria, consultoria internacional, expansão comercial, inteligencia artificial, mercado internacional, negócio