
CONTEXTUALIZAÇÃO DO CASO CARREFOUR
No dia 26 de novembro de 2024, o grupo varejista Carrefour emitiu uma retratação ao Brasil após uma postagem polêmica nas redes sociais. A questão teve início no dia 20 de novembro, após a divulgação de uma carta aberta da empresa ao sindicato agrícola francês, na qual prometia deixar de vender carnes do Mercosul na França. Isso provocou, logicamente, a indignação do setor agropecuário brasileiro, que decidiu sabotar a empresa em solo nacional.
Apesar de parecer um incidente repentino, casos como esse têm origem nas negociações e tentativas de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia, debatidas desde 1999.
REAÇÃO DO GOVERNO BRASILEIRO E DO SETOR AGROPECUÁRIO

A ação tomada pelo então presidente do Carrefour, Alexandre Bompard, causou indignação, uma vez que ele afirmou que se o acordo fosse firmado, seria através de um caso “infundado”. Segundo sua visão, a carne brasileira não cumpriria as normas fitossanitárias e ambientais da Europa e, desse modo, um acordo entre o Mercosul e a União Europeia seria inviável. Em resposta, associações pecuárias questionaram o posicionamento, trazendo como argumento a não reprovação das carnes brasileiras em outros países.
Após a repercussão do caso, a situação chegou até o governo brasileiro. O atual ministro da agricultura, Carlos Fávaro, deixou claro seu “apoio” ao boicote por parte de frigoríficos brasileiros, elogiando a posição tomada e repudiando mais uma vez o que foi dito pelo representante do Carrefour. Certeiramente, também comentou que decisão francesa não se tratava somente de uma barreira sanitária, mas de uma barreira comercial, que degradava a imagem do produto brasileiro frente à comunidade internacional.
A RETALIAÇÃO FRANCESA E O CONTEXTO POLÍTICO INTERNO

Embora pareça um caso isolado, o boicote iniciado pelo setor agropecuário brasileiro é uma resposta às pressões internas do cenário político francês, o qual se opõe à possibilidade de um acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul. O presidente do Sindicato dos Agricultores da França, por exemplo, Arnaud Rousseau, diz que a agropecuária do Brasil e da Argentina utilizam pesticidas, agrotóxicos e antibióticos que não são aceitos na França e, dessa forma, não poderiam competir com produtos franceses.
De maneira semelhante, analistas afirmam que o mercado da pecuária francesa seria o mais afetado, dada a alta competitividade de produtos sul-americanos no mercado francês, que afetaria os meios de sobrevivência de seus agricultores, pois a Europa é sua principal fonte de escoamento. Apesar das discussões e controvérsias geradas, o governo brasileiro aceitou os pedidos de desculpas dados pela empresa e o ministro da Agricultura reiterou o desejo de que a situação voltasse à normalidade. Desse modo, o boicote ao Carrefour Brasil foi encerrado.
O ACORDO DE LIVRE COMÉRCIO: DESAFIOS E OPORTUNIDADES PARA O BRASIL

Durante a cúpula do G20, que ocorreu nos dias 18 e 19 de novembro de 2024, agricultores franceses organizaram novas mobilizações violentas contra o acordo de livre comércio entre os blocos, temendo até um fechamento parcial, uma vez que também ocorreram processos diplomáticos em torno da pauta. Essas manifestações marcam um momento histórico nas negociações, sendo lideradas pelo argumento de uma “concorrência desleal”. A retaliação também veio por parte do governo francês, com o presidente Emmanuel Macron sendo o principal obstáculo para as ambições brasileiras, com discursos públicos em apoio ao bloqueio do acordo entre o Mercosul e a União Europeia.
A partir das tensões diplomáticas e econômicas, como exposto acima, evidencia-se que se trata mais de uma medida protecionista do que uma barreira sanitária real, da qual a França tenta se esconder. Contudo, apesar da insatisfação francesa, os líderes do Mercosul e da União Europeia anunciaram oficialmente a conclusão das negociações na Cúpula do Uruguai realizada dia 6 de dezembro.
O acordo bilateral proporcionará uma posição mais vantajosa para o Brasil e para o bloco econômico do Mercosul no cenário internacional, além de ampliar a base de parceiros econômicos, promovendo o multilateralismo. O Brasil terá a diminuição e até a eliminação de tarifas, bem como concessões de cotas, nas exportações de algumas commodities, como carnes, etanol, cachaça, frutas, entre outros, o que aumentará o acesso do Brasil ao mercado europeu.
CONCLUSÕES E PERSPECTIVAS FUTURAS
Por fim, o acordo também afetará as taxas de importação de mercadorias do bloco europeu, como no setor automotivo. O fechamento do acordo representa uma aproximação comercial que abrirá portas para mais mecanismos de cooperação política e econômica, sendo a maior parceria de trocas comerciais do mundo atual. Vale ressaltar que, no contexto atual, de tendência a medidas protecionistas por parte de alguns países, o acordo estimula novas aberturas econômicas em escala global.
Segundo uma pesquisa do IPEA, o Brasil será o maior beneficiado, com aumento contínuo no crescimento do PIB, maior atração de investimentos estrangeiros e ganhos na balança comercial. No entanto, uma das maiores preocupações nas discussões refere-se ao possível impacto negativo sobre a indústria nacional, devido à entrada de produtos manufaturados europeus no país.
Um ponto importante, considerado uma vitória da diplomacia brasileira, foi a inclusão de um artigo sobre compras governamentais. O documento permite a participação de empresas estrangeiras em licitações, mas com margem de preferência para produtos e serviços nacionais, além de políticas de incentivo a micro e pequenas empresas, e à agricultura familiar. O uso das compras governamentais como ferramenta de fomento à indústria nacional, especialmente nos setores comercial, tecnológico e científico, busca garantir o desenvolvimento interno do Brasil, evitando a dependência externa.
QUEM ESCREVEU:

Agnes Silva dos Santos
Diretora de Negociação

Giovanna Martins
Consultora de Gestão de Pessoas
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